Pular para o conteúdo principal

SÍNDROME DO PÂNICO



Reza o mito que Pã era um deus grego da natureza que possuía uma aparência nada agradável – era muito feio – e que tinha por hábito cochilar em moitas ou grutas próximas da estrada. Sendo assim, quando um viajante desafortunado e distraído interrompia o seu cochilo, Pã ficava extremamente aborrecido e emitia um grito tão terrificante que o coitado chegava a ficar com o cabelo todo arrepiado; chegando alguns a morrer com o susto.

Na literatura médica a síndrome do pânico aparece sob a classificação de Transtornos de Ansiedade. - não vem ao caso aqui descrever os sintomas que são apresentados nesses manuais. Mas vale destacar que alguns equívocos são cometidos no diagnóstico da Síndrome do Pânico, por conta do desconhecimento dos sintomas que a compõe, e também por conta de uma visão isolada em relação aos mesmos. Algumas pessoas chegam ao consultório trazendo o diagnostico a tiracolo, e dizem: “estou com Síndrome do Pânico”. Como se esta fosse fruto de um vírus ou uma bactéria.

A síndrome do Pânico causa muito sofrimento e afeta consideravelmente a vida familiar, profissional e social da pessoa que sofre deste mal, tendo em vista que um dos sintomas subseqüentes a uma manifestação do ataque de pânico é o da Agorafobia. No grego, ágora significa lugares púbicos, e fobia refere-se a um medo não identificado. O sintoma da Agorafobia, portanto, limita em muito a vida da pessoa. Por exemplo: Uma pessoa que tenha tido um ataque de pânico evita sair de casa, pois teme que o mesmo venha a se repetir.

O diagnóstico da Síndrome do Pânico é de certo modo recente. Foi codificado em 1980, “na terceira edição do Manual de Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais (DSM-III)”. No entanto, a bem da verdade, Freud, no artigo “Sintomatologia Clínica da Neurose de Angústia” (1894), destacou vários dos sintomas que hoje são apresentados sob a roupagem da Síndrome do Pânico, como característicos do que ele denominou e demonstrou ser uma “neurose de angústia”. Não se trata aqui de um jogo de nomenclaturas, mas de uma questão de conceito.

Se o que está na base da tão propalada Síndrome do Pânico é a angústia, então perguntamos: qual o remédio que tem o poder de curá-la? Qual o remédio para a angústia? Sem dúvida que temos alguns bons e eficientes psicotrópicos hoje em dia. No entanto, a única “pílula dourada da felicidade” que conhecemos hoje é azul, e chama-se Viagra, mas mesmo assim não deve ser utilizada de forma indiscriminada e nem sem orientação médica, por conta dos sérios efeitos colaterais que pode apresentar.

Tratar a Síndrome do Pânico pela via medicamentosa não seria como jogar a água da bacia, com o bebê que está dentro fora? Ou seja, elimina-se o sintoma, mas ao mesmo tempo reduz, significativamente, a qualidade de vida do paciente. Besset denuncia esta tendência de resumir questões subjetivas geradoras de angústia a questões exclusivas do corpo, dizendo que: “Circunscrita pelo discurso médico, que dela faz um sintoma, a angústia torna-se facilmente objeto de medicação.”

É tomando a Síndrome do Pânico como um ataque de angústia que entendemos ser necessário um tratamento que contemple a fala do paciente, como forma de desalojar da caverna e da moita dos sentimentos de quem sofre deste mal, aquilo que tanto lhe assusta. Se a angústia aparece como um sentimento difuso e a princípio sem causa, é porque ela aponta para algo que é da ordem do inconsciente. A proposta do tratamento psicanalítico é de tornar consciente o inconsciente, usando como recurso básico e fundamental a fala daquele que sofre.

O tratamento adequado da Síndrome do Pânico permite que a pessoa liberte-se dos seus sintomas e tenha uma melhor qualidade de vida. A proposta da psicanálise é acolher a pessoa a partir daquilo que a inquieta, que faz sofrer, pedindo uma coisa: fale do que lhe incomoda. Para quem sofre um analista diz: “fale-me do seu sofrimento!”



Ailton Gonçalves Desidério

Comentários

reflexão & Vida disse…
Muito bom! Gostei! Valeu por ter enviado!

Postagens mais visitadas deste blog

O INFARTO DA ALMA

Existem várias maneiras de entendermos a depressão. Como já disse em vídeos anteriores, a depressão não é resultado de um único fator, mas sim de vários fatores. Hoje, quero falar da depressão como consequência do infarto da alma — um estrangulamento interior causado pelo represamento das emoções e pelos traumas da vida que não foram devidamente elaborados. Para explicar essa ideia, quero fazer uma analogia com o que conhecemos da medicina. O infarto do miocárdio é uma doença caracterizada por placas de gordura que se acumulam nas artérias coronárias, obstruindo a circulação sanguínea. Quando uma dessas placas se desloca, forma-se um coágulo que interrompe o fluxo de sangue, levando à diminuição da oxigenação das células do músculo cardíaco (miocárdio), o que resulta no infarto. Na página da Sociedade Brasileira de Cardiologia, há um cardiômetro que marca, em tempo real, o número de pessoas que morrem no Brasil por problemas cardíacos. A média é de um óbito a cada 90 segundos. E o ...

GRAMÁTICA DA VIDA

O que seria da vida se não fosse a linguagem? Quando se trata de vida humana, simplesmente não seria. O ser humano é razão e emoção, pensamento e sentimento — e é por meio da linguagem que ele se constitui como sujeito. É a partir da linguagem que surge a "gramática da vida". Essa gramática é tão essencial que podemos nos perguntar: foi o homem quem criou a gramática ou foi a gramática quem criou o homem? O que vem primeiro: o ovo ou a galinha? A gramática ou a vida? Dilemas à parte, o fato é que a vida só é possível por meio de uma linguagem que atravessa o sujeito antes mesmo de sua existência. Se há vida, há palavra. Se há palavra, há vida. Quando faltam as palavras, falta a vida. “Morto não fala.” Mas não devemos confundir a gramática da vida com a gramática da língua. A gramática da língua possui regras que precisam ser obedecidas. Já a gramática da vida subverte essas leis. Na linguagem da vida, a fala correta — a fala autêntica — é aquela que se forma nos tropeço...

A FORÇA DE ATRAÇÃO DO NADA

Certa ocasião, quando participava de um congresso na cidade de Gramado, aproveitei a oportunidade para explorar as belezas daquela região. Foi então que conheci uma das vistas mais impressionantes do Brasil: o cânion Itaimbezinho. Uma paisagem simplesmente deslumbrante. Se você ainda não conhece, vale a pena conhecer. Mas tome cuidado: a altura do Cânion Itaimbezinho é de 720 metros e, como você sabe, o abismo atrai, deixa a gente meio zonzo e... O que existe no abismo para que ele exerça tamanha força de atração sobre as pessoas? Não existe nada. Mas o abismo é um nada que atrai. Como disse Nietzsche: “Quando você olha muito tempo para o abismo, o abismo olha para você.” O nada, o abismo, tem a ver com a força especulativa e fantasiosa do desejo. O desejo é o canto da sereia que atrai os viajantes incautos. É por sermos seres do desejo que nos aproximamos do abismo. Somos atraídos por esse “nada pleno” que é o desejo — que, em algumas ocasiões, nos coloca em verdadeiras enrascadas...