Somos o que somos não por conta do nome que recebemos, mas dos adjetivos que nos são dados por pais, familiares e amigos. Inteligente! Burro! Bonito! Feio! Gordo! Magro! Cabeção! Idiota! Estabanado! Etc. As palavras têm o poder de criar sulcos, valas, caminhos sinuosos, assim como os rios, que acabam influenciando o curso da vida, positiva ou negativamente. Em geral as palavras acabam fazendo um pouco das duas coisas.
Quando nascemos recebemos um nome e sobrenome. Os nomes escolhidos refletem o gosto do pai, da mãe, ou dos dois. Nomes possuem significados e durante o período da gravidez os pais chegam a consultar o dicionário do significado dos nomes. É assim que: Aline significa graciosa e elegante, Almir – brilhante e capaz, Denise – gentil e amante da beleza, Paulo – disposto, corajoso; e por aí vai.
Penso que a força de um nome não está no nome e nem no sobrenome propriamente ditos, mas no adjetivo. Sem dúvida que o nome tem sua influência sobre a pessoa, mas o que é dito a esta pessoa, em especial durante os primeiros anos da sua vida, influenciará de forma muito mais determinante a sua vida do que o nome que é colocado em sua certidão de nascimento. É que as palavras criam sulcos por onde a vida escoa.
As pessoas não são o que são por conta do nome que receberam – o nome até que ajuda, mas elas são o que são por conta dos adjetivos, dos rótulos que receberam. O adjetivo, diz o dicionário Aurélio, tem o poder de modificar o substantivo, denotando-lhe uma qualidade, um modo de ser, um caráter.
Caráter tem a ver com caractere, ou seja, com algo que imprime uma marca. A letra “a” de uma antiga máquina de escrever deixa a sua marca na folha branca, com maior ou menor intensidade, a depender da força que foi empregada sobre a tecla. Em alguns casos, empregando-se uma força maior do que a necessária, o bater da tecla sob a folha vai além de deixar uma simples marca produzindo um furo na folha.
Os adjetivos, enquanto um conjunto de caráctereres imprimem com maior ou menor intensidade, marcas indeléveis na vida de uma pessoa. A pergunta que se estabelece é: o que fazer com as marcas que foram impressas na memória de forma indevida? Como se apaga a marca de um caractere? Se no papel já é difícil, para não dizer impossível, o que dizer no psiquismo.
Muitas são as teorias e correntes psicológicas que se propõem a apagar do psiquismo os adjetivos que produzem dor e sofrimento na vida de uma pessoa. A proposta é de algumas teorias é de produzir um recondicionamento, uma reprogramação da mente, assim como os técnicos de informática fazem com um computador. Mas é possível fazer a mesma coisa na mente?
Os adjetivos podem ser resignificados a partir do momento em que são questionados, confrontados. O cogito cartesiano diz: penso logo existo. Mas por que penso o que penso? Por que penso o que não quero pensar? Por que quanto mais não quero pensar no que penso aí é que acabo pensando? Um pensamento não surge do nada. Ele necessita de uma matéria prima que é a linguagem adjetivada do outro.
Não somos nós que criamos os adjetivos. Nós os recebemos por herança, se bendita ou maldita isso é outra história. Os adjetivos nos são atribuídos como uma caricatura do que os outros pensam ao nosso respeito, e são acolhidos como pura expressão da verdade.
Adjetivos são assim: ninguém vive sem eles. As vezes eles afagam o nosso ego, outras vezes causam feridas na alma. O importante nessa história toda é que os adjetivos são como decalques: se quisermos eles não colam.
Ailton G. Desidério
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