A culpa é do pai! Tenho uma colega que vive mexendo comigo por ter uma leitura psicanalítica e ela uma leitura diferente. Ela diz: “pra você tudo é o pai”. Não é bem assim, mas ela não está de tudo errada. Explico! É que na psicanálise o pai ocupa uma posição central. Ele é o instaurador da lei, ou seja, aquele que impede que o filho sustente e leve adiante a sua fantasia amorosa e incestuosa em relação a mãe. Estou falando do complexo de Édipo.
Se a relação com a mãe é incestuosa. A relação com o pai é de rivalidade. Você acha que estou viajando na maionese? Não é necessário ser um psicanalista, nem mesmo um psicólogo, para observar que a temática do filme diz respeito a uma relação de conflito entre o filho e o seu pai. Algumas falas do filme deixam isso bem claro, cito algumas: “mãe, não estou agüentando mais. Vem me resgatar.”; “Estou lendo um livro sobre um cara que matou o pai.”; “Eu odeio meu pai.” Não fique pensando: “que filho malvado, cruel, como pode dizer isso a respeito do próprio pai?”. O cinema é uma arte e o que todo artista busca é revelar as nuances mais profundas da vida, mascaradas no cotidiano. Você teria coragem de publicar os seus sentimentos mais íntimos e odiosos publicamente? Não se preocupe. O artista faz isso por você.
Os sentimentos não são necessariamente a expressão de uma verdade. A Bíblia diz: “enganoso é o coração.”. Uma característica marcante dos sentimentos é a ambivalência. Você já observou que amamos o que odiamos e odiamos o que amamos? É que o oposto do amor não é o ódio, mas a indiferença. Alguém já lhe tratou com indiferença? Como você se sentiu?
Se a vida é dinâmica, e sabemos que é. Nada melhor do que um dia após o outro para nos depararmos com questões mal resolvidas que clamam por solução, e Deus na sua infinita Graça usa as situações difíceis da vida para tratar as feridas da nossa alma. O sofrimento é terapêutico e por vezes ele aproxima as pessoas, promovendo uma reconciliação quem se a dor seria muito difícil. É que a dor promove a reflexão e por conseqüência uma revisão da vida. Já dizia o sábio Salomão: “Melhor é ir à casa onde há luto do que ir à casa onde há banquete, porque naquela está o fim de todos os homens, e os vivos o aplicam ao seu coração.”
O que o enredo do filme mostra de forma romantizada é que a doença do pai levou o filho a fazer um flashback da própria vida, ajudando-o a enfrentar e eliminar os fantasmas do passado que ainda atormentavam a sua mente. Não devemos amar a dor, o sofrimento. O masoquismo é uma doença. Mas não devemos desprezá-los. Seria ótimo se pudéssemos resolver nossos problemas sem dor, sem enfrentamento, mas fadas, duendes, sapos que viram príncipes só existem nas estórias de crianças. Não busque os problemas, mas quando eles aparecerem não os ignore, enfrente-os de forma didática, extraindo deles todo potencial de crescimento espiritual, emocional, familiar e porque não dizer profissional.
Rubem Alves escreveu um livro com um tema muito sugestivo: “Ostra feliz não faz pérola”. Logo no início do livro ele conta a história de algumas ostras felizes que entoavam uma música delicada e melodiosa canção, enquanto uma ostra solitária entoava um cântico triste, muito triste. As ostras felizes diziam: “Ela não sai da sua depressão...”. Mas não era depressão, era dor mesmo. O que as ostras felizes não entenderam era que o canto triste era um movimento interno para livrar-se de um pequeno grão de areia que rasgava as entranhas da ostra triste. Um belo dia um pescador lançou a rede e retirou do mar as ostras felizes e a ostra triste. Para sua surpresa observou que no interior de uma das ostras havia uma pérola, uma linda pérola. É verdade! Ostra feliz não faz pérola. A Bíblia diz: “Sabemos que Deus age em todas as coisas para o bem daqueles que amam a Deus.”
Quando você viu seu pai pela última vez? Uma pergunta muito sugestiva que deve nos levar a considerar que problemas também têm prazo de validade. Ou gente os resolve ou morremos com eles. O que você prefere?
Ailton Gonçalves Desidério
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