Não adianta negar. Todos nós, uns mais, outros menos, temos medo da morte. É instintivo. É espiritual. É psíquico. Por incrível que pareça a vida está alicerçada no medo da morte. É em defesa da vida que montamos toda uma estrutura de negação da morte, sendo o sistema religioso uns dos mais bem elaborados, pois tem como objetivo amenizar, já que anular é impossível, a crueza, a frieza, a dureza da morte. Sempre gosto de fazer uma distinção entre religião e fé. Nem todos os religiosos tem fé e nem todos os homens e mulheres de fé tem uma religião.
O medo da morte é um sentimento angustiante. O que é a angústia se não uma resposta preventiva em relação a morte? Através de uma maquinação inconsciente podemos dizer que as pessoas se angustiam como forma de se defenderem do medo da morte. Ninguém morre de angústia, pois a angústia é por si só sinal de uma luta contra a morte. Mas é possível morrer de melancolia, pois nesta não existe nenhuma força de resistência contra a morte, mas sim um ato de entrega, uma desistência da vida. Daí que pior do que a inquietude da angústia é a morbidez da melancolia.
A vida não tem poder de influenciar a morte, aceitemos ou não, a morte é uma realidade inexorável. Mas, ao contrário, a morte pode e deve influenciar a vida. É admitindo a realidade da morte que podemos ter uma melhor qualidade de vida. Quem nega a morte nega também a vida. É que quem vive na dimensão da supremacia da vida sobre a morte desvaloriza as oportunidades, desrespeita os limites do corpo e ignora o valor dos relacionamentos interpessoais. As pessoas morrem de overdose de vida e não de overdose de morte. É no afã de quererem tudo, ao mesmo tempo, agora, que as pessoas ultrapassam os limites do corpo e perdem o que tem de mais precioso: a vida.
Ter medo da morte não é ruim. Na verdade nenhum medo é todo ruim. Viver sem ter medo, por menor que ele seja, é que é perigoso e mortal. Os super-heróis não tem medo de nada, eles podem tudo. Acreditar na existência de super-heróis: super homens, mulher maravilha, homem de ferro, e tantos outros, não é problema. Problema mesmo é quando se tenta viver como um super herói. Aí é uma desgraça!
Na Idade Média, uma pessoa de trinta anos já era considerada velha e próxima da morte. Hoje, a expectativa de vida aumentou: no Japão, país com a maior expectativa de vida do mundo, a média é de 86,44 anos para as mulheres, e 79,59 para os homens (jornal Estado de São Paulo, de 26 de julho de 2010). Um dos problemas do aumento da expectativa de vida é o que fazer com a vida. O que significa que não deveríamos medir a vida tão somente pelos anos de vida, mas também pelas realizações, pelo bom uso do tempo que a vida nos oferece.
Morrer faz parte da vida. Quem sabe que foi por conta desta percepção fina da vida que o poeta disse: “navegar é preciso viver não é preciso”. Só quem já enfrentou o mar agitado, cortando as mais altas e temerosas ondas e vagas, sabe o quanto a vida é preciosa. Só quem enfrenta corajosamente o medo da morte, assim como fez Ulisses, na Odisséia de Homero, atravessando e enfrentando os desafios do mar, pode descobrir novos horizontes, novas terras, novas possibilidades, alcançar novas conquistas e celebrar o amor, símbolo maior da vida, com a pessoa amada. Sendo assim o poeta está certo: “navegar é preciso viver não é preciso.”.
Você está com medo de morrer? Isso é um bom sinal. Você está na luta. Há esperança para você.
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