Pular para o conteúdo principal

FELICIDADE EXISTE?

A vida pode ser comparada a uma linha de trem com suas várias estações. Nesse sentido, a felicidade seria uma dessas estações por onde o trem passa na ida e na volta. Felicidade é assim: ela vai, mas ela volta. O problema é que a maioria das pessoas acha que é possível ser feliz o tempo todo, o que acaba gerando frustração, depressão e angústia — sintomas claros de uma sociedade cada vez mais marcada e dominada pelo imperativo da felicidade. Ser feliz dói? Dói! Por exemplo: a felicidade de um atleta que subiu ao pódio por ter conquistado uma vitória não é a felicidade de alguém que superou os obstáculos com facilidade. Antes de chegar ao pódio, ele sentiu dor — muita dor — por causa dos exercícios. Durante a competição, também sentiu dor, por conta do esforço máximo. Depois da competição, continuou sentindo dor, por causa do forte estresse emocional e físico. É sempre assim: felicidade e sofrimento andam juntos. A questão não é o desejo legítimo de querer ser feliz, mas o pensamento de que a felicidade pode ser alcançada sem dor, sem esforço, sem empenho e independente das escolhas feitas na vida. Essa felicidade é barata, irresponsável, casuística, pueril, fugaz e inconsistente. O problema aqui é que essa felicidade instantânea e superficial sempre custa caro — muito caro. Hoje em dia, a felicidade está sendo oferecida nas farmácias, que viraram verdadeiros shoppings de lazer para os hipocondríacos. Está nos livros de autoajuda — verdadeiros best-sellers — que apresentam soluções simples e rápidas, passo a passo, para todos os problemas da vida. E, por incrível que pareça, até mesmo em muitas igrejas evangélicas que estão vendendo a ilusão de uma vida sempre pra cima, rica e imune a qualquer tipo de dor. Estão prometendo o que nem Jesus prometeu. Basta ler os evangelhos para constatar isso (João 16.33). Enfim, a felicidade virou produto — e o mercado está cada vez mais promissor. No filme À Procura da Felicidade, há uma frase do personagem Chris Gardner (Will Smith) que diz: “Esta parte da minha vida, esta pequena parte, se chama felicidade. Foi então que comecei a pensar sobre Thomas Jefferson, na Declaração de Independência, e na parte sobre o nosso direito à vida, à liberdade e à busca da felicidade. E eu me lembro de pensar: como ele soube colocar a palavra ‘busca’ ali? Talvez a felicidade seja algo que só possamos perseguir, e talvez nunca consigamos realmente tê-la. Não importa o que aconteça. Como ele sabia disso?” E aí, felicidade existe?

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O INFARTO DA ALMA

Existem várias maneiras de entendermos a depressão. Como já disse em vídeos anteriores, a depressão não é resultado de um único fator, mas sim de vários fatores. Hoje, quero falar da depressão como consequência do infarto da alma — um estrangulamento interior causado pelo represamento das emoções e pelos traumas da vida que não foram devidamente elaborados. Para explicar essa ideia, quero fazer uma analogia com o que conhecemos da medicina. O infarto do miocárdio é uma doença caracterizada por placas de gordura que se acumulam nas artérias coronárias, obstruindo a circulação sanguínea. Quando uma dessas placas se desloca, forma-se um coágulo que interrompe o fluxo de sangue, levando à diminuição da oxigenação das células do músculo cardíaco (miocárdio), o que resulta no infarto. Na página da Sociedade Brasileira de Cardiologia, há um cardiômetro que marca, em tempo real, o número de pessoas que morrem no Brasil por problemas cardíacos. A média é de um óbito a cada 90 segundos. E o ...

EROS E PSIQUÊ: AMOR COM ALMA E AMOR DESALMADO

Amor é uma palavra simples e complexa. Simples por ser amplamente utilizada. Complexa porque só tem sentido quando está relacionada a outra pessoa. Usado de modo isolado, solto, “amor” é uma palavra vaga e sem sentido. O amor não existe sozinho. Amor, do verbo amar, só existe quando é conjugado: eu amo, tu amas, ele ama, nós amamos, vós amais, eles amam. Simples assim. Será? No português, usamos a palavra “amor” para descrever diversas situações, com os mais variados sentidos. No grego, empregam-se três palavras com significados específicos para o que chamamos, genericamente, de amor: ágape — amor divino; philos — amor fraterno; eros — amor apaixonado, sexualizado. É sobre esse tipo de amor, sobre Eros, que quero falar. Farei isso a partir do mito grego entre Eros e Psiquê, como forma de destacar que não existe Eros sem Psiquê. Ou seja, não existe amor sem alma. Antes, porém, julgo importante destacar que eros, de onde vem a palavra erotismo, e pornos + graphô, origem da palavra ...

GRAMÁTICA DA VIDA

O que seria da vida se não fosse a linguagem? Quando se trata de vida humana, simplesmente não seria. O ser humano é razão e emoção, pensamento e sentimento — e é por meio da linguagem que ele se constitui como sujeito. É a partir da linguagem que surge a "gramática da vida". Essa gramática é tão essencial que podemos nos perguntar: foi o homem quem criou a gramática ou foi a gramática quem criou o homem? O que vem primeiro: o ovo ou a galinha? A gramática ou a vida? Dilemas à parte, o fato é que a vida só é possível por meio de uma linguagem que atravessa o sujeito antes mesmo de sua existência. Se há vida, há palavra. Se há palavra, há vida. Quando faltam as palavras, falta a vida. “Morto não fala.” Mas não devemos confundir a gramática da vida com a gramática da língua. A gramática da língua possui regras que precisam ser obedecidas. Já a gramática da vida subverte essas leis. Na linguagem da vida, a fala correta — a fala autêntica — é aquela que se forma nos tropeço...